Estamos no Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio – tema que deve ser debatido com frequência. Então, pegando carona no tema, a pediatra Dra. Cristiana Meirelles fala sobre esse mal que também habita, muito mais do que imaginamos, os universos da infância e adolescência – são muitos os casos de depressão nessa fase.
“Nos últimos anos, estamos vivenciando um aumento do número de crianças e adolescentes com depressão.
Pesquisas demonstraram que uma em cada 37 crianças foram diagnosticadas com depressão entre 2011-2012 nos EUA. O suicídio foi a segunda causa de morte entre crianças de 12 a 17 anos em 2010, segundo dados da OMS – portanto, a situação é realmente preocupante! Precisamos falar sobre a depressão na infância.”
Quais são as causas desses transtornos depressivos?
Não há uma isolada e sim vários fatores que podem interagir levando à depressão, como questões genéticas, fisiológicas, ambientais e temperamentais.
Quais são os principais fatores de risco para desenvolver depressão na infância?
Como muitos pais têm dificuldade em identificar a depressão nos filhos, listei os principais fatores que representam um risco maior de depressão na infância e adolescência. São eles:
- Problemas emocionais graves durante a gestação.
- História familiar de depressão ou transtornos psiquiátricos.
- Tentativa de suicídio em parente próximo.
- Depressão materna.
- Estresse tóxico na infância, incluindo agressões físicas, morais e verbais, excesso de cobrança, abuso sexual, falta de afeto e de presença qualitativa dos pais, exposição precoce ao trabalho infantil, perda recente da figura de referência (devido à morte ou separação), agenda “mini executivo”.
- Cyberbullying.
- Exposição excessiva às telas, como TV, tablets e celulares.
- Exposição a conteúdos inadequados ou violentos (por games, vídeos, filmes, desenhos e mensagens de texto).
- Quadro de ansiedade excessiva.
- Privação crônica de sono devido a horários inadequados de dormir e despertar e quantidade insuficiente de horas de sono pela faixa etária.
- Terceirização da infância com redução do tempo de presença dos pais.
- Oportunidades de brincadeiras restritas.
- Pouca convivência com os pares.
- Tempo ao ar livre e brincadeiras na natureza limitadas.
Como a criança não é capaz de compreender e expressar bem seus sentimentos, os adultos muitas vezes interpretam os sinais de depressão como crises da idade e essa prática também se replica, muitas vezes, ao adolescente. Por isso, a doença é mais difícil de ser diagnosticada.
Você sabe quais são os principais sinais e sintomas da depressão para os quais devemos estar atentos?
Também listei alguns. São eles:
- Sentimento de culpa ou baixa autoestima; dificuldade de tomar decisões.
- Distúrbios do sono, como sonolência excessiva, insônia, despertar precoce.
- Apatia.
- Desinteresse pelas atividades habituais e por brincadeiras.
- Redução da energia ou irritabilidade/agitação.
- Dificuldade de concentração.
- Alterações do apetite, desde comer em excesso à anorexia e alterações do peso.
- Agitação psicomotora ou lentidão.
- Pensamentos suicidas, comportamento de auto injúria.
Se estes sintomas estiverem presentes por mais de duas semanas e acarretarem prejuízo nas atividades da criança ou adolescente na escola e no seu meio social, há forte suspeita de depressão.
Além desses, existem outros sinais inespecíficos que podem estar presentes nas crianças menores de 12 anos, como:
- Dor na barriga, dor de cabeça, enjoo, dores nas pernas (sem causas aparentes).
- Choro fácil.
- Comportamento de roer unhas ou morder lápis, mutismo seletivo abrupto (recusa em falar) e tiques.
- Distúrbios do sono, como insônia, medo de dormir sozinho, pesadelos frequentes, terror noturno, sonolência excessiva.
- Enurese noturna (voltar a fazer xixi na cama).
- Recusa em ir à escola.
- Dificuldades escolares e queda do rendimento escolar.
- Agitação, irritabilidade, agressividade.
- Comportamento opositor.
Essas queixas não devem ser minimizadas pelos pais, familiares e professores e as crianças devem sempre ser levadas às consultas com o pediatra assistente.
O que podemos fazer quando há risco de depressão na infância?
Organizar a rotina de sono, com horário e tempo satisfatórios por idade, é essencial. Também devemos nos atentar ao tempo e conteúdo de tela, sempre seguindo as recomendações por idade. Brincadeiras e atividades de lazer, principalmente com a participação dos pais, é imprescindível – aliás, é recomendada atividade física de 60 minutos ao dia.
Praticar técnicas de relaxamento ou “mindfulness” também é um estímulo indicado. É de extrema importância que a escola esteja continuamente orientada para saber lidar e guiar a criança da forma mais adequada.
E qual o tratamento da depressão na infância?
Além das medidas acima, a criança e a família devem ser encaminhadas para psicoterapia. Técnicas de meditação e atenção plena podem ajudar. Além disso, medicações ansiolíticas e antidepressivas devem ser usadas nos casos de depressão moderada a grave, prescritas por profissional experiente. Proporcionar um ambiente afetuoso, harmonioso e estimulante torna o processo de cura mais rápido e efetivo.”
Fontes
Departamento Científico Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento (2016-2018) • Sociedade Brasileira de Pediatria (agosto/2019).
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